A. Contexto Geral
Escrevo esta dissertação for a de Moçambique. Portanto, longe das preocupações centrais do dia de hoje: o regresso a Moçambique de Venâncio Mondlane. Curiosa e estranhamente na mesma hora em que quatro presidentes dos partidos concorrentes às eleições de outubro tem um encontro agendado na Presidência! Ninguém pensa que isto é uma coincidência do acaso, mas isso é questão para outra ocasião.
Chegou o momento de reconhecer quem verdadeiramente pode resolver a nossa situação. Não é a Frelimo, por razoes evidentes de interesse do estado atual das coisas; não é o nosso Presidente, que está de saída, não é o Podemos, que sem Venâncio Mondlane ninguém o conhecia fora dos seus membros ativos, muito menos a Renamo que se auto-sabotou, nem o MDM que não evolui muito. Estes partidos competiram nas eleições, mas a resposta do povo, incidiu sobre o Podemos. Desde o momento que Venâncio Mondlane foi forçado a deixar o país, o Podemos perdeu a sua relevância porque o povo foi mobilizado por Venâncio e agora, o povo levou em suas mãos as suas reivindicações, para além da questão eleitoral.
Toda a arquitetura de qualquer partido em Moçambique hoje não representa mais do que os membros ativos e seus interesses pessoais ou de grupo. Os partidos esqueceram-se de que quem determina uma vitória eleitoral não é o membro, mas o simpatizante. Por outras palavras, se 100 fosse a meta, 15 são membros e 85 são apenas simpatizantes. Dependendo do que o partido propõe (manifesto), se esse trabalho não incidir sobre os 85, o partido se engana sobre a sua importância.
Hoje, só duas pessoas podem resolver esta situação e isto deve ser urgente: Daniel Chapo, proclamado pelo Conselho Constitucional, e Venâncio Mondlane, que na realidaadeem as 85 das 100 pessoas consigo.
Por isso, todo outro discursante deve ficar de Lado e prestar assistência aos dois assim que solicitado. Os grandes intelectuais que se servem da televisão para nos impressionar a nós, a plebe, “nyararai”, calem-se por um tempinho.
Assim, a recepção de Venâncio hoje vai ditar o futuro de Moçambique. Mas esse não é o meu foco hoje.
O foco são dois temas determinantes destas manifestações nacionais. Antes de tudo, devemos dizer que a diabolização destas manifestações foi possível, primeiro pela eliminação física de Elvino Dias e Paulo Francisco Lopes Guambe, cabeças pensantes do combate de Venâncio Mondlane. E pelas tentativas de eliminação do Venâncio, assim como o levantamento de processos judiciais contra ele, forçando-o a fugir. Quiseram neutralizar assim a direção das manifestações, promoveram e facilitaram a criminalidade para desacreditar estas manifestações genuínas. Não nos enganemos: a luta ainda está por começar.
B. Interrogações Centrais
Neste marasmo político, o protagonista principal deixou de ser o Venâncio (ou o Daniel), para ser o povo manifestante. E o tema deixou de ser a eleição fraudulenta, e passou a ser a dignidade e a condição de vida do Moçambicano. Eu proponho que o momento é histórico: alguns autores e instituições nacionais podem ver este como o momento ideal para libertar-se do constrangimento atual imposto pela ordem político-econômica vigente, e começar a responder positivamente às questões socioeconômicas que estas manifestações estão a formular de maneira clara: A SOBERANIA E O EMPREGO. Tudo o resto poderá suceder-se.
1. A SOBERANIA
1.1. SOBERANIA ALIMENTAR
Neste contexto, quero abordar soberania primeiro sob o ângulo alimentar: Não é pai, quem não pode dar comida à sua família. Como nação, não temos soberania alimentar e isso foi demonstrado pela guerra na Ucrania (trigo), e agora pelo fecho intempestivo da fronteira de Ressano Garcia, que levou o governo de Moçambique a solicitar viaturas militares para a escolta de camiões de produtos alimentares sul-Africanos para os supermercados, especialmente os 56 shoprites do país.
Ficou claro que o SUSTENTA apenas sustentou, efemeramente, membros de um partido, e mesmo assim, sem sucesso.
Ficou claro que os potenciais do país, terras, águas, etc., só beneficiaram de investimentos políticos e por isso não contribuem nada para a segurança alimentar.
Ficou claro que ter uma boa estrada de Maputo para a África do Sul foi prioritário em relação a uma boa estrada Maputo-Pemba, passando por todas as capitais onde se pode escoar produção agrícola suficiente para regar o país. Não há interesse nesta rota Sul-Norte (nem estrada, nem via férrea).
1.2. SOBERANIA DE SEGURANCA NACIONAL
Não se pode analisar a soberania alimentar penas. Neste artigo, entretanto vou limitar-me a uma segunda soberania fundamental: a soberania territorial.
A presença militar estrangeira nos humilha a nós, um país que diz ser produto de uma luta armada de libertação nacional contra o colono português, o mesmo português que lidera hoje a missão militar da União Europeia que diz estrar a treinar as nossas forças. Uma missão Europeia que começou em 2021 e se prolonga até 2026.
Um país saído de 16 anos de guerra interna. Um país que ajudou a libertar o Zimbabwe, e que jogou um papel importante no fim do apartheid na África do Sul!
Um país com 33 milhões de pessoas, com mais de 800.000Km2, a ser ajudado militarmente por um outro país africano de pouco mais de 14 milhões de pessoas e pouco mais de 26,000Km2 (Cabo Delgado sozinha representa 82,000Km2).
Esta é uma situação que me parece tanto mais aberrante porque existem antigos combatentes da Frelimo e da Renamo que constam de uma lista salarial e, portanto, a experiência de combate devia existir.
Apelamos a que haja fim destas missões militares e que o exército Moçambicano seja verdadeiramente formado na sua integridade combativa, ética e protetora, no respeito das populações, aspecto importantíssimo em tempo de guerra. Aienar a população em tempo de guerra é desastroso. Esse outro país Africano parece não ter prazos de saída. E nisso tudo, militares de outros países não africanos se vem esconder.
Restauremos a soberania, invistamos nas nossas forças armadas. Comida, apoio logístico e respeito pelas forcas armadas reforçará o respeito das forças armadas pelo povo.
Quero insistir aqui num aspeto que ninguém nos diz: os incidentes das forças armadas contra a população e contra a imprensa são promovidos propositadamente para descreditar as nossas forças e promover o famoso terrorismo, que ainda não conseguimos definir. Não existe terrorismo em Cabo Delgado. Existe um esquema por aqueles que beneficiam das minas, do gás, das madeiras e outros recursos de Cabo Delgado. Matar, intimidar e descreditar as forças armadas, não dar comida nem logística, salários atrasados, enquanto o povo recebe comida de forças estrangeiras.
Eu tenho sérias dúvidas de que um soldado Moçambicano esteja satisfeito com a presença renovada de forças armadas estrangeiras, um certificado claro da nossa incompetência. Com tantos combatentes da Frelimo e da Renamo nas folhas salariais, existe aqui uma contradição dialética.
Passemos agora ao mais importante elemento determinante da situação em que vivemos faz agora mais de dois meses:
2. A JUVENTUDE
Antes de falar de jovens, quero falar de mim mesmo. Não sou jovem, mas eis aqui os gastos mensais mínimos na minha família (e somos apenas 3 pessoas), excluindo gastos de viatura, do condomínio onde moro, e outros próprios da minha situação particular:
Guarda: 3.000MT
Ajudante de casa: 3.000MT
Eletricidade: 3.000MT
Água: 1.200MT
DSTV: 3,800MT
Comida: 8.000MT (exclui saídas, restaurantes, camarão, etc.)
Contribuições sociais: 600MT
Solicitações de família alargada: 1.200MT
Que salário mínimo devia eu ter? Deixemos esta questão em suspenso na esperança de que a mensagem seja clara: quem ganha 15.000MT, não pode ter guarda, criada de casa, e deve poupar mais na comida, não pode ter internet e DSTV, etc. E no mínimo, deve ter emprego.
Emprego é a questão que a juventude levanta: todo esse acesso à educação (sem falar de qualidade) e à saúde (sem falar de qualidade), a alimentação etc., é dependente do emprego, do trabalho remunerado, um direito humano universal consagrado. Diz-se que cada ano cerca de 300,000 jovens moçambicanos entram para o mercado do emprego (carta aberta de Helder Martins), dos quais apenas cerca de 14.000 conseguem empregar-se, e mesmo assim devem pertencer ao partido (...). Que fazer dos outros 286.000 jovens/ano ou 5,7 milhões dos últimos 20-30 anos? Que também vão constituindo famílias e tendo crianças que devem ter educação, saúde, abrigo e alimentação, de pais desempregados?
Devemos primeiro, converter a educação. Faze-la sair de uma educação latino-europeia de formação teórica que promove a memorização e repetição de teorias livrescas, mas que não ensina a pessoa
a transformar a madeira em cadeira,
a transformar matéria em material,
a conservar o tomate do hoje em tomate daqui a cinco meses, etc.
Falar de educação em Moçambique exige um tratado inteiro: os exames de escolha múltipla, que promovem no jovem atitudes antissociais de adivinha, preguiça e suposição, os livros com erros crassos, as elites que não estudam nas nossas escolas do estado, a não valorização das línguas nacionais no ensino (enquanto o chinês aprende em chinês, o francês na sua língua, o inglês na sua, o português na sua, o russo na sua) e tantos outros assuntos que como digo merecem um tratado separado)
Segundo, e este é o argumento central deste artigo, a transformação da nossa banca, que hoje se limita a obedecer aos interesses e desígnios do capital estrangeiro, asfixiando a circulação interna do capital, através dos instrumentos de taxas de juro de empréstimo e das reservas interbancárias obrigatórias. Um sistema financeiro claramente alienado do povo (como ilustram as longas bichas do cliente – o tal rei- à porta do banco), e mesmo alienado da Estratégia Nacional de Desenvolvimento 2025-2034 (apoie aqui para ler o meu artigo sobre este tema), a qual não tem financiamento definido.
Podia falar do Banco de Moçambique, mas este está totalmente político e precisa de ser resgatado porque é por aí que deve começar a libertação dos outros bancos da praça: juros e depósitos obrigatórios. Que o nosso banco central deixe de ser a correia transmissora do FMI e do B Mundial!
Podia falar dos bancos que já desapareceram, mas isso equivaleria a chorar pelo meu pai que desapareceu em 1974.
Quero falar dos vivos, e do banco de que sou cliente há mais de vinte anos, o BIM. Me parece mais accessível ao povo, sobretudo quando se trata de pagar propinas.
Quero e ouso falar apenas da parte de Moçambique que conheço minimamente, a Provincia de Tete, e nela, dos corredores que conheço, que são apenas:
o corredor Tete-Zóbwè,
o corredor Tete-Kalomwe,
o corredor Tete-Kasakatiza, e
o corredor Tete-Chifunde.
Cada corredor com mercados semanais de beira de estrada.
Se o Banco se concentrasse nestes corredores e levasse a cabo estudos destes mercados (produtos alimentares e outros produtos caseiros de primeira necessidade). E se o banco tivesse a autonomia de iniciativas e de decisões financeiras e econômicas, podia estar em posição de avaliar a sua capacidade de assumir e gerir riscos, baixar a taxa de juros para 2-2.5% e disponibilizar empréstimos de não mais de 20.000 meticais por empreendedor ou 50.000 meticais por associação. Extrapolado para toda a Província, não seriam mais do que 100 polos econômicos. Se cada polo envolvesse 200.000 meticais, estaríamos a falar de 20 milhões de meticais. Que banco sério não tem tal disponibilidade?
O emprego no banco deve deixar de ser como um emprego no serviço de estado, para ser realmente uma instituição comercial econômica e financeira. Não de funcionários que não podem fazer nenhum estudo de marcado e que passam a vida a contar e a proteger o numerário! Faze-lo circular é que faz crescer a economia ao nível local. Nem precisa ser economista.
Porque é aí que se encontra o jovem, que explora a agricultura da Angonia e do Zóbwè, que explora a madeira do Chifunde, que explora o carvão vegetal de Musakama ou Changara
Uma tal descentralização do poder bancário libertaria e empoderaria as forças produtivas desempregadas. Teriam assim demonstrado ter entendido o sentido das manifestações.
Quem muda depois da mudança vai sobreviver;
Quem muda com a mudança vai ter sucesso;
Quem causa a mudança há-de liderar.
Como o leitor pode ler nas entrelinhas, eu não estou satisfeito com a situação do nosso país. Nem pertenço a partido nenhum, e nenhum partido me impressiona nesta altura.
Mas o povo anseia pela SOBERANIA NACIONAL.
Jose
09 de Janeiro de 2025
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